Vinte anos foi o tempo que levaram as discussões judiciais até uma decisão, em 2018, que ainda provoca calafrios nas concessionárias de infraestrutura. Na ocasião, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) resolveu colocar um fim à imunidade de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para empresas que ocupam áreas licitadas pela União.

Estavam em jogo dois casos específicos: o de um terminal da Petrobras no porto de Santos (SP) e o de uma revendedora de veículos no aeroporto de Jacarepaguá (RJ). A deliberação, porém gerou um efeito cascata. Desde então, surgiram dezenas de cobranças por prefeituras de todo o país.

O problema é que contratos de concessão ou de arrendamento firmados pelo governo federal não consideravam a incidência do tributo em sua equação. Com essa conta imprevista – às vezes feita de forma retroativa e consumindo uma parte significativa do faturamento das empresas -, o equilíbrio econômico-financeiro dos projetos ficou em evidência.

As ferrovias temem que seus carnês de IPTU venham especialmente salgados. Além de terminais e pátios de manobras, as concessionárias do setor têm milhares de quilômetros de trilhos cortando áreas urbanas e agora sujeitos à cobrança do imposto municipal por suas faixas de domínio (o espaço de utilidade pública, normalmente de 15 metros de largura, em cada lado da linha).

O impacto é estimado pela Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF) em R$ 3,7 bilhões por ano – sem falar em retroatividade. É um valor que supera em 10%, por exemplo, tudo o que foi investido pelas operadoras de ferrovias em 2019.

Havia um entendimento pacífico sobre o assunto, mas a discussão foi mudando. De um tempo para cá, algumas prefeituras começaram a nos cobrar. Hoje temos liminares judiciais nos protegendo temporariamente da cobrança, mas é insegurança jurídica na veia, diz Fernando Paes, diretor-executivo da associação.

Em Santos, onde teve início o imbróglio, a prefeitura informou ao Valor que arrendatários de 65 áreas no porto devem pagar R$ 16,3 milhões de IPTU em 2021. Muitos operadores aderiram ao Refis local para acertar pendências do passado. A decisão do STF foi amplamente acatada pela grande maioria dos arrendatários, que já regularizou seus débitos tributários com o município, o que pode ser feito mediante adesão às anistias tributárias.

O presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Jesualdo Silva, confirma que muitas empresas decidiram não contestar mais a cobrança judicialmente por temor de eventuais represálias, como problemas na obtenção ou renovação de alvarás de funcionamento. Tivemos associados entrando em Refis com mais de R$ 20 milhões para pagar, observa.

Em agosto, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) reconheceu que a incidência de IPTU tem potencial de causar desequilíbrio contratual, mas disse que fará avaliação caso a caso – o que não tem data para ocorrer.

O maior aeroporto brasileiro também foi atingido. A prefeitura de Guarulhos tenta cobrar R$ 48,3 milhões ao ano de IPTU da GRU Airport e ofereceu até um parcelamento para a quitação de débitos relativos a exercícios anteriores, com juros e correção monetária. A administradora aeroportuária rejeita a cobrança, diz entender que a legislação lhe protege e não pagou nada.

Fonte: http://www.revistaferroviaria.com.br/detalhe-noticias.asp?InCdEditoria=2&InCdMateria=33508&utm_campaign=newsletter_05-01-2021_-_04_e_0501_-_2x_-_le&utm_medium=email&utm_source=RD+Station